"Eu quero saber o que você não conta para ninguém", Juliana pedia. Eu, cansado dos seus jogos intelectuais, muitas vezes inventava algo que julgava interessante para satisfazer sua insaciável curiosidade. "E se eu viajasse para longe? E se eu fosse embora? E se eu morresse?". Sua verborragia contrastava com o silêncio na hora do sexo. Sempre compenetrada deixava escapar alguns gemidos miúdos, quase inaudíveis não fosse a minha insistência em puxar seu pescoço e trazê-la perto. Ela se debatia, empurrava, mas acabava cedendo. E eu enlouquecia.
Aos sábados ela ficava viva. Esquecia a maquiagem, as roupas, até a depilação que nunca estava em dia. Dava umas risadas muito altas, almoçava sorvete, me olhava séria-zombeteira e começava a desfilar sua infindável enciclopédia de interrogações: " Podemos ir ao cinema esta noite? Me acha gorda? Vamos viajar no reveillón?"
Hoje ela está calada. Não posso dizer que o silêncio não me é agradável. Ela cozinha, sorumbática, de coque amarrado no alto da cabeça deixando uns poucos fios fazendo cócegas na nuca. Ela, às vezes, morde a pele do canto da unha, franze a testa como quem é invadida por pensamento ruim e mexe o molho de tomate com vigor. Que suja a borda da panela, o fogão, as ideias e até a cara dela. Ela não limpa. Esfrega os olhos com as costas da mão e eu vejo um pedaço da sua nádega branca, porque a blusa sobe e ela não usa roupa de baixo, ela nunca usou roupa de baixo no final de semana.
Acendo um cigarro e desejo que morra, suma, saia da minha frente e enfim me deixe em paz. Com ela tudo falta. Eu sou do tipo que só se completa sozinho. Ela estala os ossos do pescoço enquanto cozinha nosso último almoço.
Colocava o nariz atrás de sua orelha e puxava forte. "Cheiro é instante", eu dizia. Ele não entendia, talvez nunca tenha compreendido metade das coisas que dizia entender, um terço do que saía da sua boca e todo o meu olhar, mas fingia que sim e isso por hora bastava.
Tinha um pouco de dificuldade de esquecer todo o resto, "é que é melhor assim". Mas insistia, talvez mais do que ele quisesse e depois que eu enfim extasiava, vinha me beijar, abraçar. Eu respirando forte, tentando recuperar o ar, a boca quente molhada dele com o meu gosto e o que eu mais queria era que ele saísse de cima de mim. Como se aquele minuto sem fôlego fosse para ser vivido sozinho. Depois ele ia pro chuveiro e eu morria de frio e saudade. Pedia. Ele voltava com a pele lisa, gelada. Passava a mão na sua barba e o achava tão bonito. Nesse momento, conseguia enxergá-lo melhor, como se ficasse mais nítido, como se passasse nos olhos o efeito 'sharp' do Photoshop. Os olhos apertados, alguns fios da sobrancelha perdidos entre os olhos. Você é tão bonito, bonito. Eu nem tenho coragem para sentir, sentir tudo isso. Coloca a mão aqui, não, aqui. Eu não vou embora, não me deixa ir. Não dorme. Se você dormir eu vou, não dorme, por favor. Guilherme, eu gosto de dizer o seu nome no meu carioquês de erre arrastado. Guilherrrrrme, fica.
Ele fazia que não mas eu sabia, porque sou dessas que sabe, que ele ia. Cedo. Antes do que combinamos, antes de eu comer o resto do chocolate que ficou na sua geladeira, antes de eu lavar aquela calcinha que ele arrancou de olhos fechados e eu joguei no fundo da mochila. E ficou lá.
Aos sábados ela ficava viva. Esquecia a maquiagem, as roupas, até a depilação que nunca estava em dia. Dava umas risadas muito altas, almoçava sorvete, me olhava séria-zombeteira e começava a desfilar sua infindável enciclopédia de interrogações: " Podemos ir ao cinema esta noite? Me acha gorda? Vamos viajar no reveillón?"
Hoje ela está calada. Não posso dizer que o silêncio não me é agradável. Ela cozinha, sorumbática, de coque amarrado no alto da cabeça deixando uns poucos fios fazendo cócegas na nuca. Ela, às vezes, morde a pele do canto da unha, franze a testa como quem é invadida por pensamento ruim e mexe o molho de tomate com vigor. Que suja a borda da panela, o fogão, as ideias e até a cara dela. Ela não limpa. Esfrega os olhos com as costas da mão e eu vejo um pedaço da sua nádega branca, porque a blusa sobe e ela não usa roupa de baixo, ela nunca usou roupa de baixo no final de semana.
Acendo um cigarro e desejo que morra, suma, saia da minha frente e enfim me deixe em paz. Com ela tudo falta. Eu sou do tipo que só se completa sozinho. Ela estala os ossos do pescoço enquanto cozinha nosso último almoço.
Colocava o nariz atrás de sua orelha e puxava forte. "Cheiro é instante", eu dizia. Ele não entendia, talvez nunca tenha compreendido metade das coisas que dizia entender, um terço do que saía da sua boca e todo o meu olhar, mas fingia que sim e isso por hora bastava.
Tinha um pouco de dificuldade de esquecer todo o resto, "é que é melhor assim". Mas insistia, talvez mais do que ele quisesse e depois que eu enfim extasiava, vinha me beijar, abraçar. Eu respirando forte, tentando recuperar o ar, a boca quente molhada dele com o meu gosto e o que eu mais queria era que ele saísse de cima de mim. Como se aquele minuto sem fôlego fosse para ser vivido sozinho. Depois ele ia pro chuveiro e eu morria de frio e saudade. Pedia. Ele voltava com a pele lisa, gelada. Passava a mão na sua barba e o achava tão bonito. Nesse momento, conseguia enxergá-lo melhor, como se ficasse mais nítido, como se passasse nos olhos o efeito 'sharp' do Photoshop. Os olhos apertados, alguns fios da sobrancelha perdidos entre os olhos. Você é tão bonito, bonito. Eu nem tenho coragem para sentir, sentir tudo isso. Coloca a mão aqui, não, aqui. Eu não vou embora, não me deixa ir. Não dorme. Se você dormir eu vou, não dorme, por favor. Guilherme, eu gosto de dizer o seu nome no meu carioquês de erre arrastado. Guilherrrrrme, fica.
Ele fazia que não mas eu sabia, porque sou dessas que sabe, que ele ia. Cedo. Antes do que combinamos, antes de eu comer o resto do chocolate que ficou na sua geladeira, antes de eu lavar aquela calcinha que ele arrancou de olhos fechados e eu joguei no fundo da mochila. E ficou lá.