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Silêncio

"Agora só me falta aprender o silêncio". É do Zeca Baleiro. Eu gosto da voz dele, de piano e do seu cheiro. Gosto também de mudar a palavra aprender para apreender. Mais um ''e'' e tudo fica tão maior, avassalador. Arrebatador. Você usa essas palavras e eu, eu gosto tanto de você!
Silêncio e todo mundo sabe. Os poetas, os cantores de pagode, os cineastas. Que ilusão achar que pode se saber aquilo que a gente nem chega perto. Dormindo os meus sonhos gritam. Calada tento não balançar com o carnaval que rola aqui dentro. A respiração mexe, eu não fico em paz.
Eu jamais me cairia de você e mesmo assim tenho sentido tanto medo.
Silêncio, não conseguir mais escrever, ter a inspiração roubada. É quando você vai embora e eu começo a gritar. Pode ser branco, preto. O meu tem todas as cores de fevereiro, máscaras e um sol rachando na nuca, o meu silêncio tem me deixado bronzeada. Com gosto de chocolate, sorvete de flocos e brigadeiro. O meu silêncio é gordo. Tem olhos verdes e o beijo mais quente da lapa.
Um dia ele vira música, virá. Com violão cor de madeira meio desafinado, blusa de malha com um buraco debaixo do braço e textura de abraço de mãe.
É bom ter o silêncio que me mostra um mundão. Eu lembro do barulho que a gente faz ouvindo jazz, mudos. Parece que foi ontem e foi, foi ontem.

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Final de verão tem dessas coisas

"Teve um dia que você foi meu. Eu sabia que era, você achava que era e eu tive muito medo disso. Nós dois sentados no tapete, com o sol do final de verão deitado do nosso lado e o silêncio das crianças brincando longe. Você me deu a mão, me encostou na parede e me abraçou. E disse que era meu, naquele dia pelo menos, eu sabia que era. As minhas pernas foram ficando fracas e eu sentei no chão para disfarçar. Você é meu, agora, mesmo com as outras moças por aí, com a minha falta de romantismo e com o meu band-aid descolando do calcanhar, você é meu. O que eu faço com você agora? Pensei que poderia deixá-lo dentro do meu armário, eu te tiraria de lá quando precisasse muito de uns dos seus versos fáceis que me faziam entender o mundo e seus tons de cinza. Depois imaginei que você não ia gostar de ficar preso no armário e não poder ver as coisas por aí, você estava tirando a minha calça com aquela sua delicadeza como se não quisesse amassar as roupas e eu estava pensando aonde ia enfia...

Baby, I'm so alone. Vamos pra Babylon.

Eu tinha o que, uns dezesseis anos. Aí eu escutava uma música e achava que o mundo estava se mostrando para mim. Desezzeis anos e começando a entender o mundo. Tocando duas punhetas por dia, ouvindo Beatles, achando que rock brasil anos 80 era uma grande merda e que elas... as meninas... um mistério. Ela sabia que mexia comigo. Ela sabe que hoje, trintão de barba por fazer. ainda mexe. Com dezesseis ela pediu: Vamos fugir? Eu não quis. Porque tinha leite na geladeira e o meu cachorro só comia quando eu botava e nossa, tinha tanta menina e eu ainda estava com paciência para caralho! Eu podia sei lá, contar as folhas de grama do maracanã e ia sobrar energia. Aí o Botafogo foi piorando, as coisas na minha cabeça começaram a machucar de dentro pra fora. Ganhar dinheiro não tem sido suficiente. As meninas passaram a achar minha literatura boba. O cinema não encanta e envelhecer é quase emburrecer. Vamos fugir. Vou fugir. Vamos fugir. Ela poderia ainda queria. Vamos? Misturar tempos?...

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     Sinto, Vovô, ainda sinto tanto. Sua falta, seu cheiro, sinto como se você não estivesse aqui. E de fato não está, estará? Esses cheiros etílicos, esses brancos que muito brancos, essas moças que mal saíram da faculdade e acham que podem te cuidar. Logo o senhor, tão complexo, logo o senhor que nem nos meus quase 30 anos, pude dar conta de abarcar.      Elas não sabem que já fora campeão de atletismo, que já nadara no Rio Tietê quando ainda era limpo. Não sabem que deixara uma fila de mulheres apaixonadas quando escolhera Vovó. Não sabem do seu talento para descascar camarão ou como, em quase 80 anos, fora muito pobre, quase rico e pobre de novo.      Sinto ter que vir aqui e olhar o senhor assim, esse sobe e desce de maca, esses exames que te reviram por dentro sem contar nada de novo. É pulmão, é rim, que mais? Eles não sabem que o senhor é diferente, que jamais concordaria com tudo isso. Ah, se eles soubesse...